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De batom e capacete

De batom e capacete

15
Jun16

18.º Lés a Lés - por detrás do rímel

Dora Sofia

Foi no momento em que o alarme tocou pelas cinco da manhã que eu tive consciência da dose de loucura que era necessária para, num dia feriado, me levantar àquela hora e andar 550 km, sem outro propósito que não fosse andar de mota, andar de mota e andar de mota.

Confesso que rosnei mentalmente uns quantos impropérios ao marido pelo terrível feitio de querer ser sempre dos primeiros em tudo, obrigando-nos aqui a um número de equipa matutino, mas tão matutino que, por pouco, não saíamos no dia anterior. Por várias vezes, nesse dia e no dia seguinte, haveria de engolir os tais impropérios e agradecer não ter de esperar em filas ou correr o risco de andar de mota colada ao meu top-case.

O dia ainda não tinha clareado na Praia dos Pescadores, quando saímos em direção aos muitos quilómetros até ao Luso.

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 O primeiro desafio veio com as curvas do Caldeirão. O rapaz lá seguiu à velocidade da sua 1200, e eu fui rolando à velocidade do meu tempo, que é o tempo de quem não sabe muito de motas, mas sabe que quer chegar. A parte boa do Lés-a-Lés é que há sempre alguém à tua velocidade, ou mais devagar, ou mais depressa. Entre 1550 motas há sempre uma para te acompanhar e nunca andas sozinha.

Parámos na Barragem do Roxo, com direito a estrada de terra batida, pó e ervas secas. E, se é verdade que posso até dispensar os saltos altos, não dispenso a elegância. Por isso, um momento para retocar o batom, que isto de andar de mota não é só pó e cabelos sujos no final do dia e uma mulher, motociclista ou não, gosta de ficar bem na fotografia.

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 No Torrão, tivémos de passar numa viela estreitinha, estreitinha, sem recorrer à ajuda do doutor, lá no fundinho, que auxiliava os necessitados com um bocadinho de vaselina ou um "bico de pato" para as meninas.

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Parámos em Pavia, num controlo, e quase que conseguíamos ter uma fotografia da Anta...

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Conheço bem estes caminhos: Pavia, Arraiolos... são nomes de outos anos, em que o Alentejo era uma casa alugada, cheia de estar sozinha. Hoje, percorro os caminhos com outros olhos. No Castelo de Arraiolos, à saída, sou desafiada por uns degraus para galgar.

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Mesmo antes de entrar no caminho de terra batida que leva à Ribeira da Margem, uma mulher tira fotografias. Hesito. O caminho é longo e não consigo ver muito além. A mulher, provavelmente habituada a fazer o caminho em cima de um jipe, ou de um trator, e conduzida, certamente, por alguém, garante-me que a estrada é boa. E é boa (eu até gosto de caminhos)... até à ribeira!Os rapazes que vêm depois de mim deixam-se ficar para trás, não vá o diabo tecê-las. O marido vai dizendo o que eu tenho de fazer "dá-lhe gás, miúda!". Paro um momento. Hesito. Olho em frente e sigo.

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Um pouco mais à frente a areia está solta demais, mas, ainda assim, sigo com à-vontade. Há uma miúda estendida na berma do caminho, duas ou três motas paradas e o meu rapaz diz-me para continuar, que ela não está sozinha, mas é mais forte do que eu: desvio os olhos um segundo, apenas um segundinho, tenho a certeza, e a Branquinha desequilibra-se. Deixo-a tombar e fico de pé a olhar para ela. É aqui que eu preciso de um homem. Alguém tem de a levantar, verificar que está a trabalhar, a travar, e, claro! siga para cima dela que há muito quilómetro para fazer. Segundo desafio superado!

Já a visita à ponte Filipina sobre o rio Zêzere foi um percurso mais difícil. Um engano que acabou bem. Se eu teria ido até lá baixo, se soubesse o que tinha pela frente? Não, não teria. Se eu voltaria a ir lá abaixo assim que acabei? Sim, teria! Foi alucinante demais. A adrenalina de uma montanha russa, com partes feitas de costas, e quedas livres no vazio como as do elevador da Disney (quem lá foi sabe do que estou a falar!). 

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Na ponte, o engano continuava, com todos a garantirem que o pior já tinha passado. Eu acreditava. Afinal não imaginava que subir fosse mais difícil do que descer (sim, eu tenho uma questãozinha com as curvas em descidas íngremes, principalmente quando o asfalto é de pedras soltas e data de 1610). No entanto, aqui o subir também tem o seu quê de experiência... que eu não tenho. Valeram-me as indicações do meu instrutor permanente: "primeira a fundo, miúda! desvia-te do buraco! olha a areia na curva! olha o gancho apertado! faz a curva por fora!"

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 Cá em cima, suspiro longo! Um sorriso orgulhoso instala-se-me no rosto e pausa para comer, para beber e respirar fundo! 

A seguir, mais curvas até Góis. Outra vez cada um de nós segue ao seu ritmo. Estivemos em Góis em agosto, mas não cheguei a entrar no motoclube. Hoje há pastéis de nata bem quentinhos e a saber a canela. Que maravilha!O marido vai convivendo com os residentes...

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Já estamos perto da Mata Nacional do Bussaco. Ele parte outra vez a curtir as descidas e eu curto-as também, mas mais devagar. Enquanto espera por mim, aproveita para tirar fotografias:

 

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À chegada do Hotel Palace há mais tempo para fotografias. O sol começa a desaparecer e eu começo a agradecer por ser uma das primeiras equipas a chegar.

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Há um pequeno mimo à nossa espera, à porta do Museu Militar. Brindamos ao fim desta etapa maravilhosa e desafiante.IMG_9233.JPG

 Cá em baixo, no Luso, estão os braços dos meus amorzinhos à espera.

Há música boa a tocar, há sol a esconder-se atrás dos prédios, há gente que chega feliz. Estendo as pernas, bebo uma cerveja e sinto o calor dos sorrisos dos que amo.

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Amanhã é outro dia. Amanhã há mais histórias, aventuras e viagens para contar.

Boas curvas!

 

14
Jun16

Do querer ao poder vai a distância da vontade

Dora Sofia

Há um ano atrás enamorei-me por esta coisa de andar de mota. Quer dizer, assim, desta forma, a sério. Há um ano atrás, fiz o Portugal de Lés-a-Lés, como pendura, e adorei! Quando finalmente chegámos a Albufeira, cansados, a noite já ia avançada e eu, enquanto esperava na fila pelo momento de subir ao palanque, de sorriso nos lábios, decidi "para o ano venho na minha mota!".

Acho que não houve ninguém que não tivesse achado a ideia tão disparatada que não começasse a rir. Marido, família, amigos. Compreendo-os. Na verdade, há um ano atrás, eu nem sequer tinhar tinha experiência a andar de mota. Aliás, eu nem sequer tinha mota!

Eu insisti. O marido zangou-se com a insistência e tentou demover-me, até ao momento de eu lhe anunciar que a decisão estava tomada, portanto, disse-lhe eu, ou me ajudas a comprar a mota, ou compro-a sozinha (o que seria terrível, atendendo ao meu profundo conhecimento acerca de motas). Ele percebeu que eu falava a sério e conseguiu salvar-me de comprar um chaço velho e uma outra que, via-se logo!, após a primeira curva ia atirar comigo ao chão.

Comprei a Branquinha. Faltava o mais difícil: a experiência. A experiência não se compra no supermercado, nem se aluga num balcão dos serviços. Tinha mesmo de andar de mota! E andei! Andei, andei, andei! não fiz os 10000Km que os "entendidos" pediam como pré-requisitos, mas a vontade valia por muitos kilómetros e houve um momento qualquer em que o meu homem percebeu isso e me disse que sim, que eu era bem capaz de conseguir fazer o Lés-a-Lés.

Eu nunca duvidei que fosse capaz. Conheço-me bem. Quando quero, quero mesmo!

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Além disso, um desafio assim, uma aventura destas é o melhor psicólogo, médico, terapeuta que se pode ter. Para terem uma ideia, havia 1550 motas. 14 (apenas! ) eram conduzidas por mulheres. A minha era uma delas!! Ser capaz, conseguir, chegar ao fim, fazer todo (mesmo todo!!!) o percurso e, no final, ter a certeza que se vai repetir é das melhores sensações do mundo.De repente, percebes que és capaz, que és forte, que a tua vontade te leva longe, porque não ficaste só a sonhar, e foste, fizeste, esforçaste-te.

Não o consegui sozinha.Claro que não! O meu maridão esteve sempre comigo, a orientar-me quando eu precisei que me dissessem para pôr a primeira e "prego a fundo" desviando-me das motas caídas, que os condutores estavam bem, e sem olhar para o rio lá em baixo, ou  a curtir as suas curvas, quando eu queria tempo para a  minha velocidade. Sem ele, não seria possível. Talvez o melhor de tudo seja mesmo saber que ele está ali ao meu lado, saber que o meu querer é também o querer dele, que a minha vontade é multiplicada por dois. A isto eu chamo felicidade!Obrigada, meu amor!

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 Ficaram com vontade de saber por aonde andei no Portugal Lés a Lés? Eu prometo que conto tudo num outro post...

Boas curvas!

08
Jun16

De água nos olhos e água na boca

Dora Sofia

Deixem-me contar-vos um segredo. Às vezes, muitas vezes, a vontade de escrever sobre as minhas histórias em duas rodas não é tão grande como o tempo para andar sobre duas rodas. Além disso, deixem-me contar-vos outro segredo, eu não gosto tanto assim do meu mundo virtual. Aqui não há vento no cabelo, nem prazer debaixo da pele, nem aquele sentimento louco de liberdade...

Mas há palavras que não cabem numa imagem e há imagens que transbordam palavras. Aqui há histórias feitas de andar de mota!

A história de hoje é a dos que vivem de coração dividido entre a serra e o mar. Houve  treino intenso nas curvas da serra e olhos, quase, quase, sempre, no mar.

Começamos em qualquer lugar, com uma ideia, uma sugestão, um desafio. E, depois, seguimos as placas que nos aliciam com promessas dm monumento, de um sítio, de um lugar que te tira o fôlego. 

O lugar acaba por vir ao nosso encontro. Hojé é o cabo Espichel! Com visita ao farol e às escarpas que o cercam.

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 Paramos pelo Santuário, não para rezar, mas para comer, porque num cantinho há um bar acolhedor e simpático. Espantam-me os turistas estrangeiros que encontramos. São sempre tantos!

 

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 O rapaz incita-me aos caminhos e eu vou atrás. Gosto de terra. A minha mota não gosta tanto assim, mas entre umas escorregadelas, uns abanões e um bocadinho de frio na barriga, chegámos, por enqanto, a um compromisso: ela não me atira ao chão e eu não a deixo cair. Coisas de miúdas...

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Depois, almoçamos por Sesimbra, numa esplanada à beira-mar. A ideia era clara: comíamos qualquer coisa bem baratinha, um peixinho do dia, porque a ideia era seguir caminho, não gastar muito tempo, não gastar muito dinheiro. E assim seria, se o marido não fosse o simpático do costume, se não se deixasse enredar nas conversas aparentemente inofensivas do empregado de mesa, que o alicia com um peixe do mar, que o marido recusa por experiência, e o alicia com perceves como se se tratassem de tremoços, que são aceites por simpatia. Os perceves, não os tremoços. E a conta é choruda, mas mau, memso mau, é que eu nem gosto tanto assim de perceves...

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Continuamos pelas curvas da Serra da Arrábida. Perdemo-nos. Tenho quase a certeza, mas ele diz que não. E eu deixo-o acreditar que sim, que acredito que ele sabe mesmo para aonde vamos quando entramos no caminho de brita e terra batita. 

Alcançada a estrada, as curvas da Serra da Arrábida valem a incerteza.

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Lá em baixo, o mar é uma mistura  de cores vibrantes. E, neste momento, pensas que, afinal, não há preço para estes momentos em que te falta o ar, porque sentes toda a grandeza da serra e estás de olhos perdidos naquela imensidão de mar...

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Boas curvas!

 

 

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